Impõe-se a pergunta: estudar compensa? Para responder, temos de analisar o prémio salarial dos diferentes níveis de ensino, ou seja, quanto em média se recebe a mais por ter concluído mais um grau de formação

Uma ideia em que a generalidade dos partidos portugueses converge é a de que os ordenados em Portugal são baixos, muito baixos. Os motivos por detrás e as propostas para resolver o problema é que os distinguem. Os socialistas no poder parecem apostados numa receita: os ordenados aumentam por decreto. O ordenado mínimo nacional aumentou nos últimos oito anos cinquenta por cento. Muito acima de qualquer indicador económico para o mesmo período.

Uma consequência direta de aumentar o ordenado mínimo desta forma insustentável foi aproximá-lo muito do ordenado médio, retirando incentivo à formação, à progressão na carreira e ao mérito. Devido ao aumento artificial do salário mínimo, muitas empresas acabam forçadas a não aumentar ou aumentar menos os restantes salários, gerando naturalmente desmotivação. Para quê esforçarmo-nos se não somos justamente recompensados por isso?
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Impõe-se a pergunta: estudar compensa? Para responder, temos de analisar o prémio salarial dos diferentes níveis de ensino, ou seja, quanto em média se recebe a mais por ter concluído mais um grau de formação. Um relatório apresentado este ano pela Fundação José Neves começa por nos dizer que a diferença salarial entre quem completou o ensino superior e quem ficou pelo secundário caiu para mínimos históricos, de 50% em 2011 para 27% em 2022. O Boletim Económico de março deste ano do Banco de Portugal diz-nos mesmo que este prémio salarial dos licenciados tem caído sucessivamente praticamente sem interrupções desde 2006. Em termos reais (ajustados à inflação), os trabalhadores com o ensino básico ganhavam em 2020 mais 14% do que em 2006. Já os licenciados perderam nestes 14 anos 9% do poder de compra. O Banco de Portugal chama-lhe “compressão da estrutura salarial”. Naturalmente que haverá outros fatores, como o aumento do número de licenciados que leva a que alguns acabem a desempenhar funções menos qualificadas. Mas no país da União Europeia com a maior percentagem de adultos sem formação secundária – 39,7% – não será seguramente boa ideia inserir desincentivos ao prosseguimento dos estudos. Sobreposto a isto, temos um IRS extremamente progressivo que penaliza fortemente qualquer pequeno ganho salarial.

Não querendo enfastiar com números, cinjo-me aos essenciais para responder à pergunta que proponho e que constam no mesmo estudo do Banco de Portugal. Um trabalhador com o ensino básico recebe em média em início de carreira 740 euros líquidos (910 euros brutos). Com o ensino secundário passa a 824 euros líquidos (1.047 euros brutos). Se completar a licenciatura, 1.155 euros líquidos (1.592 euros brutos). E com mestrado, 1.193 euros líquidos (1.662 euros brutos). Para estes cálculos considerei um trabalhador solteiro e sem dependentes, que será a situação mais comum nesta fase da vida.

Optando por prolongar os seus estudos, um aluno está a fazer dois investimentos. O custo das propinas, no caso das licenciaturas e mestrados, e o dinheiro que perde – em rigor, que não ganha – durante os anos em que está a estudar e em que adia a sua entrada no mercado de trabalho. Em Portugal, uma licenciatura custa em média 2.166 euros e um mestrado – incluindo licenciatura – 3.560 euros, no caso das universidades públicas. No caso do ensino superior privado, o custo passa a 13.504 euros para a licenciatura e 22.507 euros para o mestrado.

Feitas as contas, um aluno que opte por completar o ensino secundário perde – não ganha – 31.080 euros durante os três anos dos estudos face a um seu colega que comece a trabalhar depois de completar o ensino básico. Com o prémio salarial que o país paga neste momento demorará vinte e seis anos a recuperar o investimento. Se optar por prosseguir para a licenciatura, estará novamente a investir em ordenados perdidos e propinas face a um colega que fique pelo secundário entre 36.774 euros (público) e 48.112 euros (privado). Precisará de trabalhar entre oito e dez anos para recuperar o investimento. Por fim, se completar o mestrado, serão entre 33.734 euros (público) e 41.343 euros (privado) em relação a quem comece a trabalhar depois de concluir a licenciatura. Neste caso, precisaria de entre sessenta e três e setenta e oito anos de trabalho para ser recompensado pelo seu esforço!

Agregando todo o investimento em estudo de um aluno que completa o mestrado face a um outro que opta por não estudar depois de terminar o ensino básico, temos um esforço acrescido de entre 86.440 euros (público) e 105.387 euros (privado). E um período de retorno do investimento de entre catorze e dezassete anos. Ou seja, só após o primeiro terço da carreira profissional terá valido a pena estudar.

A mensagem para os alunos que me leem não é que desistam dos estudos. Mas talvez seja boa ideia deixarem de votar em partidos que penalizam o esforço, a dedicação e o investimento, e que procuram nivelar-nos a todos, por baixo!


Artigo publicado no Diário de Notícias