É sabido que o populismo se alimenta do descontentamento e da descrença dos cidadãos relativamente às instituições públicas e aos políticos que as governam. A receita é simples e tem sido transplantada de país para país. Faz-se uma amálgama dos problemas a que as instituições não têm conseguido dar resposta, juntam-se exemplos de oportunismo da classe política – normalmente corrupção – e identificam-se grupos sociais para servirem de bode expiatório – geralmente imigrantes ou minorias étnicas, mas ricos e pobres também costumam funcionar bem. Por último, é necessária uma figura com algum carisma e capacidade cénica. A magia acontece e os votos fluem.

O termo foi cunhado no Império Russo no final do século XIX. O populismo russo visava transferir o poder político às comunas camponesas através de uma reforma agrária radical. Foi depois reivindicado nos Estados Unidos pelo Partido do Povo, com raízes em movimentos agrários cooperativistas. Já no século XX foi usado no Brasil para designar políticos carismáticos capazes de mobilizar as massas de trabalhadores migrantes para as grandes cidades. Só mais tarde adquiriu a conotação pejorativa que hoje lhe conhecemos, com as ciências sociais a associarem-no às técnicas de demagogia e manipulação usadas na propaganda política. É por vezes também empregado de forma leviana ou abusiva por políticos situacionistas, centralistas ou mesmo autocráticos para descredibilizarem qualquer tentativa de oposição.

Na Europa, os partidos populistas surgiram na década de 1990 e caminharam paulatinamente das franjas para o mainstream, adotando tanto ideologia de extrema-direita – Frente Nacional, Flemish Interest e Forza Italia – quanto de extrema-esquerda – Syriza e Podemos. Apesar dos exemplos que nos estão mais próximos serem estes da Europa Central e do Sul, foi a Leste que os populistas mais cedo chegaram ao poder. Polónia, Bielorrússia, Hungria, Eslovénia, Sérvia, Turquia, Bulgária e República Checa, todos eles já tiveram – ou ainda têm – populistas nos seus governos.

E em Portugal, como foi possível que um partido populista chegasse a terceira força? Precisamente pela capitalização do descontentamento e da descrença face à classe política. Se os problemas do país estão em banho maria há mais de vinte anos, se a economia estagnou, se os ordenados não sobem, se a justiça tarda e falha, se a burocracia nos impede de respirar, se os impostos são altos e os serviços públicos medíocres, se sucessivos governantes são acusados de corrupção, se até um ex-primeiro-ministro foi preso num processo que se arrasta há quase uma década, se o sistema é isto, onde está o anti-sistema? Foi a pergunta que fizeram e continuam a fazer centenas de milhar de eleitores.

Haverá vários responsáveis pelo “estado a que isto chegou”, mas nenhum com tanta responsabilidade como o PS, que governou catorze dos últimos vinte anos, insistindo teimosamente em políticas que já se provaram uma e outra vez falhadas e protagonizando sucessivos episódios de abuso de poder de fazer corar de vergonha qualquer país subdesenvolvido.

O PS casou-se com a democracia, mas foram as suas sucessivas traições com a corrupção, com o abuso de poder e com a incompetência que geraram este bastardo. Hoje, ironicamente, é o partido populista que dificulta as contas da alternativa, contribuindo para a manutenção do pai traidor no poder.

O populismo não se combate com ostracismo a quem o professa e muito menos a quem o segue. Combate-se com políticas sérias e com políticos sérios, que devolvam a esperança e a confiança aos cidadãos. Algo que o PS já demonstrou ser absolutamente incapaz de fazer.

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Autor: Luís Nobre Lucas
Data: 03 de maio de 2023
Publicação: Diário de Notícias