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Memórias Liberais: Setembro de 1822 — A Primeira Constituição Portuguesa

Com a instalação do primeiro parlamento liberal em Portugal- as Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa – estava firmado o primeiro objetivo do movimento revolucionário liberal de 1820.

Era necessário agora consolidar o poder alcançado com a revolução, através da elaboração de uma constituição escrita. Essa foi a tarefa fundamental das Cortes Constituintes de 1821 a 1822.

Ao longo daqueles três anos, foram muitas as questões que surgiram na sociedade portuguesa: a reunião e o local das Cortes, a elaboração de um texto constitucional escrito, os processos eleitorais, a escolha dos deputados, as reformas a empreender.

Os discursos das «casacas de briche» (isto é, os deputados vintistas, na expressão da época, que elogiava a sua austeridade na preferência de um traje fabricado em tecido da indústria nacional), na sala das sessões no Convento das Necessidades – primeira sede do parlamento português, são reproduzidas em quase todos os jornais da época. É o momento em que pela primeira vez em Portugal, nasce uma nova eloquência – a «eloquência de tribuna».

O processo constituinte motivou a que muitos portugueses pretendessem intervir, fazendo chegar ao «Soberano Congresso» centenas de propostas em forma de memórias, na melhor tradição académica, algumas manuscritas, outras impressas, para serem distribuídas pelos deputados. Grande parte destas propostas ficaram a jazer nas comissões, outras, contudo, viriam a alimentar polémicas tremendas.

A primeira preocupação dos deputados foi dotar a nova instituição parlamentar com os meios necessários ao seu pleno funcionamento: um regimento interno, um Diário das Cortes, a nomeação de comissões e a introdução da prática taquigráfica, para além de, e mais importante, nomear um novo governo- a Regência- que se manteve em funções até ao regresso de D. João VI do Rio de Janeiro.

Os trabalhos parlamentares iniciaram em fevereiro de 1821 quando Fernandes Tomás leu o seu Relatório do estado público de Portugal, onde traçava um retrato do país e das suas dificuldades e desafios. Muitos outros deputados fizeram projetos importantes que foram aprovados – da Liberdade de imprensa ou a extinção dos direitos banais (Soares Franco); da necessidade de elaboração de códigos civil e criminal (Castelo branco) da abolição da Inquisição e da Inconfidência (Simões Margiochi), da concessão de amnistia a presos políticos ( Alves do Rio) entre muitos outros. 

Deve-se igualmente às primeiras Cortes vintistas a criação das condições para a instalação da primeira instituição bancária em Portugal em 1821 – o Banco de Lisboa (mais tarde viria a constituir-se como o Banco de Portugal).

Foram, no entanto, as discussões sobre o modelo político que conduziram aos maiores combates parlamentares – a escolha do modelo unicameral ou bicameral, os poderes do rei e das cortes, as bases constitucionais, a Constituição e a independência ou união ao Brasil.

A Constituição Política da Monarquia Portuguesa é aprovada no dia 23 de setembro de 1822 e jurada por D. João VI a 1 de Outubro. O documento afastou-se frontalmente do absolutismo ao instituir um sistema tripartido de poderes, ao prever a liberdade individual e a livre expressão do pensamento, a igualdade de todos os cidadãos perante a Lei, a supremacia das Cortes Legislativas e a defesa da monarquia com evidente redução dos poderes do rei, consagrando assim os ideais liberais da época – a garantia dos direitos individuais de liberdade, segurança pessoal e propriedade.

A Constituição foi universalmente jurada e amplamente celebrada em Portugal em outubro e novembro de 1822.  A primeira Constituição é um livro com 82 páginas, composta por 240 artigos e dividida por seis Títulos – “Dos Direitos e deveres individuais dos Portugueses”, “Da Nação Portuguesa, seu Território, Religião, Governo e Dinastia”; “Do Poder Legislativo ou das Cortes; “Do Poder Executivo ou do Rei”; “Do Poder Judicial”; “ Do Governo Administrativo e Económico”. 

Teve curta duração, no entanto, a vigência deste primeiro texto constitucional. Na sequência da revolta da Vilafrancada em maio de 1823, foram dissolvidas as Cortes e a Constituição abolida. 

A Constituição de 1822 vigorou menos de um ano, entre 23 de setembro de 1822 e 3 de junho de 1823. Após a Revolução de setembro, em 1836, teria uma curta e quase simbólica segunda vigência, de 10 de setembro de 1836 a 4 de Abril de 1838, data de juramento da Constituição de 1838.

Memórias Liberais: Setembro de 1822 — A Primeira Constituição Portuguesa
Pedro Bugarín 18 de novembro de 2024
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