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O despesismo da Câmara Municipal de Lisboa

Opinião de João Graça e Luís Miguel Pereira no Observador
Foi recentemente aprovado o “maior orçamento de sempre da Câmara Municipal de Lisboa”. Palavras usadas por Carlos Moedas, com indisfarçável orgulho. E, de facto, assim é. Temos o maior orçamento de sempre. Mas é estranha a satisfação de Carlos Moedas.

Vejamos alguns factos.

O orçamento da CML (individual) para 2023 estima receitas e despesas no montante de 1.165.820.000 euros. A ordem de grandeza dificulta a leitura, mas são mil, cento e sessenta e cinco milhões, oitocentos e vinte mil euros. Ou seja, um montante anual de 2.136 euros por cada habitante de Lisboa. Dito de outra forma, uma família de três pessoas contribui o equivalente a 534 euros por mês para ter o privilégio de dispor dos serviços da CML! É este o orgulho de Carlos Moedas?

A CML prevê ter 12.739 colaboradores em 2023. Um trabalhador para cada 43 habitantes da cidade! Se somarmos os colaboradores das empresas municipais teremos então mais de 17.000 colaboradores, ou seja, um para cada 32 habitantes! Só na CML temos 1.465 administrativos, 89 secretárias, 1.528 cantoneiros de limpeza, 481 arquitetos, 489 engenheiros, 353 juristas, 135 historiadores, 119 sociólogos, 51 motoristas (de ligeiros) e até 4 costureiras (?!).

Estaremos a ser eficientes? Com o mesmo nível de delegação de competências (na saúde e na educação), não é fácil encontrar outro exemplo de tamanha ineficiência na Europa. Lisboa, é, portanto, um caso único!

O despesismo da CML não vem de agora, trata-se de um processo contínuo e persistente. Entre 2014 e 2022, o orçamento cresceu a uma taxa média anual de 6%. Para 2023 estima-se mais um crescimento, desta vez de 13%.

O orçamento de 2023 será superior em 30% ao do último ano do mandato de Fernando Medina (2021) e superior em 87% ao de 2014!

É verdade que, entretanto, se procedeu à delegação de um conjunto de competências do Estado Central, principalmente na saúde e na educação, o que é claramente positivo. Mas esta alteração não é a causa de tamanho crescimento da despesa: as transferências para a educação, por exemplo, são menos de 40 milhões de euros. Como tal, representam no orçamento de 2023 pouco mais de 3% da despesa total. São apenas o pretexto e a forma de disfarçar o despesismo da CML. Aliás, hoje também se assiste a transferências de competências do município para as suas freguesias, sem se descortinar qualquer poupança no primeiro e com acréscimos de custos nas segundas. O monstro é, de facto, imparável!

Perguntam alguns como é possível uma família “pagar” 534 euros por mês para usufruir dos serviços da CML. Pois…. Não é o munícipe que paga. São outros que pagam uma parte significativa da conta. São as empresas com sede em Lisboa (que empregam também colaboradores de outros municípios) que pagam Derrama. São os particulares e empresas que compram imóveis em Lisboa que pagam IMT. São os turistas que deixam IVA e Taxa Turística. Mas, principalmente, é a generosa Lei das Finanças Locais, que induz as autarquias a gastar aquilo que sem grande esforço conseguem arrecadar.

A título de exemplo, fosse a CML mais contida nas despesas, teria folga orçamental mais do que suficiente para isentar a Derrama, devolver a totalidade do IRS aos munícipes (dos 5% que pode receber) e reduzir substancialmente as taxas (relativamente às quais se prevê um aumento de 43% em 2023). Já para não falar na redução do endividamento… que, em linha com tudo o resto, irá novamente crescer em 2023.

Portugal tem um peso do Estado que é excessivo para o seu nível de desenvolvimento e que compromete o seu crescimento. Sendo que aloca dois terços da despesa pública à Educação, Saúde e Segurança Social. Tendo em conta a falta de qualidade do serviço prestado nas primeiras e a insustentabilidade da última, não é provável que no curto prazo haja aqui poupanças. Ou seja, temos de olhar para tudo o resto, onde se incluem as despesas das autarquias. Um eventual aprofundamento da descentralização administrativa tem necessariamente de ser acompanhado por aumentos de eficiência, que conduzam a uma efetiva redução da despesa pública, sem comprometer a qualidade dos principais serviços prestados.

Lisboa é mais do que “o maior orçamento”, é também “o maior” mau exemplo!

Artigo publicado no Observador
João Graça,Luís Miguel Pereira 2 de janeiro de 2023
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